terça-feira, 28 de maio de 2013

Cecília Meireles


Cecília Meireles é uma das grandes escritoras da literatura brasileira. Seus poemas encantam os leitores de todas as idades. Nasceu no dia 7 de novembro de 1901, na cidade do Rio de Janeiro e seu nome completo era Cecília Benevides de Carvalho Meireles.
Sua infância foi marcada pela dor e solidão, pois perdeu a mãe com apenas três anos de idade e o pai não chegou a conhecer (morreu antes de seu nascimento). Foi criada pela avó Dona Jacinta. Por volta dos nove anos de idade, Cecília começou a escrever suas primeiras poesias.  
Formou-se professora (cursou a Escola Normal) e com apenas 18 anos de idade, no ano de 1919, publicou seu primeiro livro “Espectro” (vários poemas de caráter simbolista). Embora fosse o auge do Modernismo, a jovem poetisa foi fortemente influenciada pelo movimento literário simbolista. 
No ano de 1922, Cecília casou-se com o pintor Fernando Correia Dias. Com ele, a escritora teve três filhas.  
Sua formação como professora e interesse pela educação levou-a a fundar a primeira biblioteca infantil do Rio de Janeiro no ano de 1934. Escreveu várias obras na área de literatura infantil como, por exemplo, “O cavalinho branco”, “Colar de Carolina”, “Sonhos de menina”, “O menino azul”, entre outros. Estes poemas infantis são marcados pela musicalidade (uma das principais características de sua poesia). 
O marido suicidou-se em 1936, após vários anos de sofrimento por depressão. O novo casamento de Cecília aconteceu somente em 1940, quando conheceu o engenheiro agrônomo Heitor Vinícius da Silveira.  
No ano de 1939, Cecília publicou o livro Viagem. A beleza das poesias trouxe-lhe um grande reconhecimento dos leitores e também dos acadêmicos da área de literatura. Com este livro, ganhou o Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras. 
Cecília faleceu em sua cidade natal no dia 9 de novembro de 1964.  
Relação de suas obras: 
Espectro - 1919
Criança, meu amor - 1923
Nunca mais... - 1923
Poema dos Poemas -1923
Baladas para El-Rei - 1925
O Espírito Vitorioso - 1935
Viagem - 1939
Vaga Música - 1942
Poetas Novos de Portugal - 1944
Mar Absoluto - 1945
Rute e Alberto - 1945
Rui — Pequena História de uma Grande Vida - 1948
Retrato Natural - 1949
Amor em Leonoreta - 1952
12 Noturnos de Holanda e o Aeronauta - 1952
Romanceiro da Inconfidência -1953
Poemas Escritos na Índia - 1953
Batuque - 1953
Pequeno Oratório de Santa Clara - 1955
Pistóia, Cemitério Militar Brasileiro - 1955
Panorama Folclórico de Açores -1955
Canções - 1956
Giroflê, Giroflá - 1956
Romance de Santa Cecília - 1957
A Rosa - 1957
Obra Poética -1958
Metal Rosicler -1960
Solombra -1963
Ou Isto ou Aquilo -1964
Escolha o Seu Sonho - 1964  

O menino azul



O menino quer um burrinho
para passear.
Um burrinho manso,
que não corra nem pule,
mas que saiba conversar.

O menino quer um burrinho
que saiba dizer
o nome dos rios,
das montanhas, das flores,
— de tudo o que aparecer.

O menino quer um burrinho
que saiba inventar histórias bonitas
com pessoas e bichos
e com barquinhos no mar.

E os dois sairão pelo mundo
que é como um jardim
apenas mais largo
e talvez mais comprido
e que não tenha fim.

(Quem souber de um burrinho desses,
pode escrever
para a Ruas das Casas,
Número das Portas,
ao Menino Azul que não sabe ler.)

Chapeuzinho Amarelo




Era Chapeuzinho Amarelo.
Amarelada de tanto medo.
Tinha medo de tudo,
aquela Chapeuzinho.
Já não ria.
Em festa, não aparecia.
Não subia escada
nem descia.
Não estava resfriada
mas tossia.
Ouvia conto de fada
e estremecia.
Não brincava mais de nada,
nem de amarelinha.



Tinha medo de trovão.
Minhoca, pra ela, era cobra.
E nunca apanhava sol
Porque tinha medo de sombra.
Não ia pra fora pra não se sujar.
Não tomava sopa pra não ensopar.
Não tomava banho pra não descolar.
Não falava nada pra não engasgar.
Não ficava em pé com medo de cair.
Então vivia parada,
deitada, mas sem dormir,
com medo de pesadelo.



Era Chapeuzinho Amarelo


E de todos os medos que tinha
o medo mais que medonho
era o medo do tal do LOBO.
Um LOBO que nunca se via,
que morava lá pra longe,
do outro lado da montanha,
num buraco da Alemanha,
cheio de teia de aranha,
numa terra tão estranha,
que vai ver que o tal do LOBO
nem existia.



Mesmo assim a Chapeuzinho
Tinha cada vez mais medo
do medo do medo do medo
de um dia encontrar um LOBO.
Um lobo que não existia.



E Chapeuzinho Amarelo,
de tanto pensar no LOBO,
de tanto sonhar com LOBO,
de tanto esperar o LOBO,
um dia topou com ele
que era assim:
carão de LOBO,
olhão de LOBO,
jeitão de LOBO
e principalmente um bocão
tão grande que era capaz
de comer duas avós,
um caçador,
rei, princesa,
sete panelas de arroz
e um chapéu
de sobremesa.



Mas o engraçado é que,
assim que encontrou o LOBO,
a Chapeuzinho Amarelo
foi perdendo aquele medo,
o medo do medo do medo
de um dia encontrar um LOBO.
Foi passando aquele medo
do medo que tinha do LOBO.
Foi ficando só com um pouco
de medo daquele lobo.
Depois acabou o medo
e ela ficou só com o lobo.


O lobo ficou chateado
de ver aquela menina
olhando pra cara dele,
só que sem o medo dele.
Ficou mesmo envergonhado,
triste, murcho e branco azedo,
porque um lobo, tirado o medo,
É um arremedo de lobo
É feito um lobo sem pelo
Lobo pelado.



O lobo ficou chateado.

E ele gritou: sou um LOBO!
Mas a Chapeuzinho, nada!.
E ele gritou: sou um LOBO!
Chapeuzinho deu risada.
E ele berrou: Eu sou um LOBO!!!
Chapeuzinho, já meio enjoada,
com vontade de brincar
de outra coisa.
Ele então gritou bem forte
aquele seu nome de LOBO
umas vinte e cinco vezes,
que era pro medo ir voltando
e a menininha saber
com quem não estava falando:

LO-BO- LO-BO- LO-BO- LO-BO- LO-BO- LO-BO-
LO-BO- LO-BO- LO-BO- LO-BO- LO-BO- LO-BO-
LO-BO- LO-BO- LO-BO- LO-BO- LO-BO- LO-BO-



Aí,
Chapeuzinho encheu e disse :
"Pára assim! Agora! Já!
Do jeito que você tá!"
E o lobo parado assim
do jeito que o lobo estava
já não era mais um LO-BO
Era um BO_LO.
Um bolo de lobo fofo,
tremendo que nem pudim,
com medo da Chapeuzim.
Com medo de ser comido
com vela e tudo, inteirim.
LO-BO-LO-BO



Chapeuzinho não comeu
aquele bolo de lobo,
porque sempre preferiu
de chocolate.
Aliás, ela agora, come de tudo,
menos sola de sapato.
Não tem mais medo de chuva
nem foge de carrapato.
Cai, levanta, se machuca,
vai à praia, entra no mato,
trepa em árvore rouba fruta,
depois joga amarelinha
com o primo da vizinha
com a filha do jornaleiro
com a sobrinha da madrinha
e o neto do sapateiro.



Mesmo quando está sozinha,
inventa uma brincadeira.
E transforma
em companheiro
cada medo que ela tinha:
o raio virou orrái,
barata é tabará,
a bruxa virou xabru
e o diabo bodiá.
FIM

Um menino muito maluquinho




Uma historinha inesquecível do Ziraldo...
Era uma vez,
um menino maluquinho
Ele tinha o olho maior que a barriga
tinha fogo no rabo
tinha vento nos pés
umas pernas enormes
(que davam para abraçar o mundo)
e macaquinhos no sótão
(embora nem soubesse o que significava
macaquinhos no sótão).
Ele era um menino impossível!
A melhor coisa do mundo
na casa do menino maluquinho
era quando ele voltava da escola
A pasta e os livros
chegavam sempre primeiro
voando na frente
Um dia no fim de ano
o menino maluquinho
chegou em casa com uma bomba:
"Mamãe, tou aí com uma bomba!"
"Meu neto é um subversivo!"
gritou o avô.
"Ele vai matar o gato!"
gritou a avó.
"Tira esse negócio daí!"
falou - de novo - a babá.
Mas aí o menino explicou:
"A bomba já explodiu, gente.
Lá no colégio."
"Esse menino é maluquinho!"
falou o pai, aliviado.
E foi conferir o boletim.

Esse susto não era nada
tinha outros que ele pregava.
Às vezes
sem qualquer ordem
do papai e da mamãe
se trancava lá no quarto
e estudava e estudava
e voltava do colégio
com as provas terminadas
tinha dez no boletim
que não acabava mais
Ele dizia aos pais
cheio de
contentamento
"Só tem um zerinho aí.
Num tal de
comportamento!"
A pipa que
o menino maluquinho soltava
era a mais maluca de todas
rabeava lá no céu
rodopiava adoidado
caía de ponta-cabeça
dava tranco e cabeçada
e sua linha cortava
mais que o afiado cerol.
(ele não usava cerol, sabia que era perigoso!)
E a pipa quem fazia
era mesmo o menininho
pois ele havia aprendido
a amarrar linha e taquara
a colar papel de seda
e fazer com polvilho
o grude para colar
a pipa triangular
como o papai
lhe ensinara,
do jeito que havia
aprendido com o pai
e o pai do pai
do papai.
Era preciso ver
o menino maluquinho
na casa da vovó!
Ele deitava e rolava
pintava e bordava
e se empanturrava
de bolo e cocada
E ria com a boca cheia
e dormia cansado
no colo da vovó
suspirando de alegria

E a vovó dizia:
"Esse meu neto é tão maluquinho"
O menino maluquinho tinha dez namoradas!
Ele era um namorado
formidável
que desenhava corações
nos troncos das árvores...
e fazia versinhos...
e fazia canções.
E se machucava
nos paralelepípedos...
e rasgava os fundilhos no arame da cerca
e tinha tanto esparadrapo
nas canelas e nos cotovelos
e tanta bandagem na volta das férias
que todo ano ganhava
dos colegas no colégio
o apelido de
Múmia !
E chorava escondido
se tinha tristezas
O menino maluquinho
tinha lá os seus segredos
e nunca ninguém sabia
os segredos que ele tinha
(pois segredo é justo assim).
Tinha uns mais segredáveis
E outros que eram
menos.
O menino maluquinho
jogava futebol.
E toda a turma ficava esperando
ele chegar pra começar o jogo.
É que o time era cheio de craques
e ninguém queria ficar no gol.
Só o menino maluquinho
que dizia sempre:
"Deixa comigo!"
E ia rindo pro gol para o jogo começar.
E o menino maluquinho
voava na bola
e caía de lado
e caía de frente
e caía de
pernas pro ar
e caía de bunda no chão...
E a torcida ria e gostava de ver
a alegria daquele goleiro.
E todos diziam:
"Que goleiro maluquinho!"
E aí, o tempo passou.
E, como todo mundo,
o menino maluquinho cresceu.

Cresceu e virou um cara legal!
Aliás,
virou o cara mais legal do mundo!

Mas um cara legal mesmo!
E foi aí que
todo mundo descobriu
que ele não tinha sido
um menino maluquinho
ele tinha sido era
um menino feliz!